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Oráculo

Responsável - Lúcio Packter, filósofo formado pela PUC-Fafimc, de Porto Alegre.


Hegel expressou uma opinião sobre Filosofia, especificamente?

 
Em obras como Estética e Princípios da Filosofia do Direito, o filósofo nos deu sua versão.



A arte, a religião e a filosofia só diferem pela forma; seu objeto é o mesmo.
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Cada um é filho de seu tempo. O mesmo ocorre com a filosofia, ela resume seu tempo no pensamento. É tão insensato imaginar que uma filosofia qualquer possa ultrapassar o mundo contemporâneo quanto acreditar que um indivíduo possa saltar por cima de seu tempo, possa saltar o rochedo de Rhodes.
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A filosofia sempre vem demasiadamente tarde. Enquanto pensamento do mundo, só aparece quando a realidade realizou e terminou seu processo de formação.


O que é filosofar para Merleau-Ponty?

 
Em Sentido e Não Sentido, o filósofo nos fornece uma explicação.


Filosofar é uma maneira entre outras de existir, e ninguém pode se vangloriar de esgotar, como diz Marx, na “existência puramente filosófica” a “existência religiosa”, a “ existência política”, a “ existência jurídica”, a “existência artística”, nem em geral “ a verdadeira existência humana”. Mas, se o filósofo reconhecer isso, se ele se puser como tarefa acompanhar as outras experiências e as outras existências em sua lógica imanente em vez de se colocar em seu lugar, se abandonar a ilusão de contemplar a totalidade da história rematada e se sentir como todos os outros homens aprisionado nela e diante de um futuro a fazer, então a filosofia irá se realizar suprimindo-se como filosofia separada.


O que Wittgenstein pensava da Filosofia?

 
No Tratado lógico-filosófico ele coloca seu pensamento sobre Filosofia.


A maioria das proposições e das questões que foram escritas sobre as matérias filosóficas são não falsas, mas desprovidas de sentido. Por esse motivo não podemos absolutamente responder às questões desse gênero, mas somente estabelecer que são desprovidas de sentido.
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O objetivo da filosofia é o esclarecimento lógico do pensamento. A filosofia não é uma doutrina, mas uma atividade. Uma obra filosófica consiste essencialmente em elucidações. O resultado da filosofia não é um determinado número de “ proposições filosóficas”, mas o fato de as proposições serem esclarecidas. O objetivo da filosofia é tornar claros e delimitar rigorosamente os pensamentos que de outra forma, por assim dizer, são confusos e vagos.
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O método correto da filosofia seria em suma o seguinte: não dizer senão o que pode ser dito.


O filósofo Cioran era ateu?

 
O Oráculo encontrou uma entrevista, uma das últimas que o filósofo concedeu, em Paris, em junho de 1995, publicada na revista "Kulturchronik", editada em Bonn.


Eu não sou ateu, ainda que não creia em Deus e não reze. Mas há em mim uma dimensão religiosa indefinível, para além de toda fé. O crente se identifica com Deus, o que pode compreender, mas eu mesmo me sinto distante de tudo isso. Eu me movo na linha divisória. A grande idéia do pecado original do ser humano é compartilhada por mim, mas não no modo como se pensa oficialmente sobre o assunto. Tanto a História como também o homem são, queiramos ou não, produtos de uma catástrofe. A idéia do desvio do ser humano é imprescindível para se entender o desenvolvimento da História. Segundo essa idéia, o ser humano é culpado, não no sentido moral, mas por ter se envolvido nessa aventura. Quando abandonei minha aldeia, deixei de ser primitivo. Antes, havia pertencido à Criação, como os animais, com aqueles que tinham uma relação pessoal comigo; agora me encontrava fora, à distância.

Minha mãe era presidenta da Igreja Ortodoxa em Hermannstadt e meu pai — bom sacerdote, além de sincero, mas de modo algum um homem de profunda religiosidade — queria na verdade ser advogado. Ficou muito triste quando leu o texto Sobre lágrimas e Santos, no final de 1937, pouco antes de minha mudança para Paris. Quando enviei o manuscrito ao meu editor romeno, este me telefonou um mês depois para dizer-me que não poderia imprimi-lo. Ele mesmo não havia lido, mas sim um de seus linotipistas, e disse que devia seu patrimônio à ajuda de Deus e que não poderia publicar um livro assim por nada nesse mundo. De minha parte, em plenos preparativos de viagem à França, perguntei-me desesperado o que fazer. Na ocasião, encontrei-me com um romeno que havia colaborado com a Revolução Russa e tinha conhecido Lênin. Perguntou-me o que acontecia, contei-lhe a história e ele era dono de uma gráfica. Assim, meu livro foi lançado sem um selo editorial, pouco depois de ter-me mudado para Paris. Alguns meses depois, recebi uma carta de minha mãe, na qual falava sobre a desgraça que meu livro havia provocado. Ainda que não fosse em verdade uma religiosa, sentia-se sob fortes pressões e rogou-me que retirasse o livro de circulação. Respondi que era a única obra religiosa escrita nos Bálcãs, porque era uma confrontação balcânica com Deus. Quase todos meus amigos reagiram mal, sobretudo Mircea Eliade, que escreveu uma crítica extraordinariamente dura, enquanto que uma garota que eu conhecia me disse que era o livro mais triste que havia lido. Evidente que se tratava de uma experiência religiosa equivocada. Eu havia mergulhado de tal modo na vida dos santos que, na verdade, deveria ter rezado. Mas para isso me faltavam os dotes necessários, ainda que me sentisse atraído pelos grandes místicos. Porém, a fé religiosa não é nunca resultado da reflexão, mas algo muito complicado. A religiosidade pode ser tola, mas tem raízes muito profundas (risos).


Como as ideias se ligam entre elas?

 
Uma das respostas mais famosas é oriunda da obra de David Hume, no Ensaio Sobre o Entendimento Humano. Vejamos.


...a natureza estabeleceu conexões entre as idéias particulares, e que uma idéia, logo que aparece aos nossos pensamentos, introduz sua correlata e dirige nossa atenção na direção dela, mediante um movimento suave e insensível. Estes princípios de conexão ou de associação foram por nós reduzidos a três, a saber: semelhança, contiguidade e causalidade, que são os únicos laços que unem entre si nossos pensamentos e que engendram a série regular de reflexão ou do discurso que, em maior ou menor grau, se realiza entre todos os homens. Ora aqui surge um problema do qual dependerá a solução da presente dificuldade. Admitindo-se que em todas as relações, quando um dos objetos é revelado aos sentidos ou à memória, o espírito não é apenas induzido a conceber seu correlato, mas o concebe de maneira mais firme e mais forte, indagamos se esta nova concepção poderia ser alcançada de outro modo? Parece-nos que é o que ocorre com a crença originada da relação de causa e efeito. Ora, se o mesmo fenômeno se verifica em outras relações ou princípios de associação, poder-se-ia considerá-las uma lei geral ocorrendo em todas as operações do espírito.


Comte criticou o ensino? Ele ofereceu algo filosófico, um ensino em outros termos?

 
Em seu Discurso Preliminar sobre o Espírito Posivito ele lança diversas questões filosóficas sobre o assunto. Leia:

...a superioridade espontânea da nova filosofia
sobre cada uma das que hoje disputam entre si o predomínio se acha agora tão plenamente caracterizada sob o aspecto social, como o era já sob o ponto de vista social, tanto pelo menos quanto o comporta este Discurso, e salvo a faculdade indispensável de recorrer à obra citada. Terminando esta sumária apreciação, importa notar aqui a feliz correlação que se estabelece naturalmente entre semelhante espírito filosófico e as disposições, sábias mas empíricas, que a experiência contemporânea faz de ora avante
prevalecer, mais é mais, tanto entre os governados como entre os governantes. Substituindo diretamente
uma estéril agitação política por um imenso movimento mental, a escola positiva explica e sanciona, em
virtude de um exame sistemático, a indiferença ou a repugnância que, em plena concordância, a razão
pública e a prudência dos governos manifestam hoje por toda séria elaboração direta das instituições propriamente ditas. Na época atual, por falta de uma base racional suficiente e enquanto durar a anarquia intelectual, elas não podem ter uma existência eficaz senão com um caráter puramente provisório ou transitório. Destinada a dissipar enfim esta desordem fundamental, pelas únicas vias que a possam dominar, esta nova escola carece, antes de tudo, da manutenção contínua da ordem material, tanto interna
como externa, sem a qual nenhuma grave meditação social poderia ser convenientemente acolhida ou mesmo suficientemente elaborada. Ela tende, pois, a justificar e secundar a preocupação mui legítima que hoje inspira por toda a parte o único grande resultado político imediatamente compatível com a situação atual, a qual, além disso, lhe proporciona um valor especial pelas graves dificuldades que lhe suscita, pondo sempre o problema, insolúvel com o decorrer do tempo, de manter uma certa ordem
política no meio de profunda desordem moral. Além dos seus trabalhos para o futuro, a escola positiva
associa-se imediatamente a esta importante operação por sua tendência direta a desacreditar radicalmente
as diversas escolas atuais, preenchendo, desde já, melhor do que cada uma delas, os ofícios opostos que
ainda lhes restam, e que só ela combina espontaneamente de modo a mostrar-se dentro em breve mais
orgânica do que a escola teológica e mais progressiva do que a escola metafísica, sem jamais poder
comportar os perigos de retrogradação ou de anarquia que lhes são respectivamente peculiares. Desde
que os governos renunciaram, embora de modo implícito, a toda restauração séria do passado e as
populações a toda grave destruição das instituições, a nova filosofia não tem mais a pedir a ambos senão
as disposições habituais que todos estão, no fundo, preparados para lhe conceder (pelo menos em França,
onde se deve realizar, em primeiro lugar, a elaboração sistemática), isto é, liberdade e atenção. Sob estas
condições naturais, tende a escola positiva, por um lado, a consolidar todos os poderes atuais nas mãos de
seus possuidores, quaisquer que sejam, e, por outro, a impor-lhes obrigações morais cada vez mais
conformes às verdadeiras necessidades dos povos.


Em Filosofia, podemos questionar a autonomia da Europa diante das relações com os EUA?

 
Esta é uma questão que gera amplas polêmicas. Leia o que escreveu Claudio Camargo sobre o assunto.


Depois de mergulhar o mundo na maior carnificina da história da humanidade – as duas guerras mundiais –, a Velha Europa renunciou ao seu passado belicista e foi em busca da “paz perpétua” preconizada pelo filósofo Immanuel Kant. Em 25 de março de 1957, Alemanha, França, Itália, Bélgica, Holanda e Luxemburgo assinaram o Tratado de Roma, criando a estrutura da Comunidade Econômica Européia, um ambicioso plano de união econômica e aduaneira. Cinqüenta anos depois, rejuvenescida, a União Européia se consolida como um poderoso e próspero bloco econômico que reúne 27 países-membros – a quase totalidade da Europa – com 493 milhões de habitantes e cerca de 30% do PIB mundial.

Mas o sucesso econômico não trouxe de volta a grandeur do velho continente porque este perdeu influência política. No pós-guerra, a Europa precisou do Plano Marshall para se reerguer e teve que delegar sua segurança ao poderio militar dos Estados Unidos. Este, via Otan, garantiu a unificação européia pela contenção do apetite do urso soviético e também dissipou os temores de uma Alemanha reconstruída. Em conseqüência disso, a Europa se tornou “um gigante econômico e um anão político e militar”. É emblemático o fato de que em 1992, quando o Tratado de Maastricht criou o euro, o quintal da Europa – os Bálcãs – iniciou uma guerra civil que só foi detida anos depois quando os EUA intervieram.

Hoje, nas palavras de Robert Kagan, para a Europa desfrutar os confortos da paz kantiana, ela precisa deixar a Tio Sam a tarefa de policiar o mundo, que permanece teimosamente hobbesiano (o homem como lobo do homem”, segundo Hobbes). Chegou a hora de a experiente senhora decidir se quer continuar assim ou se vira gente grande e assume suas responsabilidades geopolíticas. A vida adulta pode começar aos 50.


As séries de TV fazem conversações com a Filosofia ultimamente, não acham?

 
O Oráculo encontrou muitas respostas afirmativas para este fenômeno. Confira o que a Editora Três publicou sobre o tema.


Era o começo dos anos 90 e todos acompanhavam a série de televisão Seinfeld. Irwin, então, arriscou relacionar algumas teorias filosóficas apresentadas em aula com as situações retratadas pelo seriado... No texto, citações de personagens da trama se misturam às teorias de Ludwig Wittgenstein e Jean-Paul Sartre de forma estranhamente natural.

A ficção das séries se provou tão rica que uma enxurrada de títulos semelhantes se seguiu. Hoje, Irwin tem 51 livros publicados e divide espaço com outras editoras que investiram no filão. “Nosso objetivo é democratizar a filosofia”, diz Simone Regazzonni, coautor de “A Filosofia de Lost” e “A Filosofia de House”, que se debruçam sobre duas séries de enorme sucesso atualmente no ar. Em “House”, Simone justifica a conduta aparentemente antiética do protagonista, Dr. House, no esforço para salvar seus pacientes com a lógica da “razão que determina a vontade”, do filósofo Immanuel Kant. Nela, Kant explica que o compromisso obsessivo com uma meta hiperética – no caso de House, o bem-estar do paciente – permite desvios de conduta para atingi-la.

Na obra que trata da filosofia em “X-Men”, de mutantes com superpoderes, Jean Grey, um deles, opta por acabar com a própria vida para salvar a de seus colegas. Sob várias perspectivas, o suicídio é condenável. Mas, na ficção, ele pode ser heroico e serve de provocação. O filósofo romano Sêneca é evocado para apresentar essa interpretação. “O homem sábio vive o tempo que deve, não o tempo que pode”, diz o livro.
No Brasil, novelas e minisséries já foram assunto de estudos filosóficos. A diferença é que aqui esses trabalhos ficaram na academia. “São teses complicadíssimas, distantes demais do grande público”, explica Nilson Xavier, autor de “Almanaque da Telenovela Brasileira”. Para ele, o trunfo dos livros de Irwin e Simone é a linguagem acessível, mesmo quando o assunto é complexo. Mas nem todos pensam assim. Antonio José Valverde, professor de filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, teme que iniciativas como essas banalizem o ensino. “Esse tipo de divulgação pode ser um desserviço à filosofia, que acaba sendo apresentada de forma diluída”, afirma. As vendas dos livros e a audiência das séries mostram que o processo parece inexorável.

   

Como referenciar: "Oráculo" em Só Filosofia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 27/11/2024 às 07:42. Disponível na Internet em http://filosofia.com.br/oraculo_resposta.php?pg=14